Ruiva

Espero um dia gritar para que ela pare.



O primeiro rosto que vejo pela manhã.
Não é a face de meu amor,
já não dormimos na mesma cama.
Não é a face de meus pais,
nem sequer acordaram quando saio.

Acordo,
tomo meu banho,
faço uma leve refeição,
afogado em pensamentos,
pensamentos do dia, da noite,
das coisas que fiz,
das coisas que ainda preciso fazer.
Todo este ritual, inclusive o descer dos degraus de meu prédio,
faço sozinho,
sem um rosto humano.

Ao passar da porta de saída e virar a esquina,
caminho alguns passos até vê-la.
Todos os dias,
na mesma hora.
Algumas vezes antes, quando me atraso em sair.
As vezes depois, mais distante de minha casa, quando saio mais cedo.
Mas todos os dias ela está ali,
para o bem de meus olhos,
Ela,
aquela estranha,
de pele branca e leves sardas,
os cabelos vermelhos,
fogo irlandês,
brilhante sob o sol na mesma intensidade das chamas em noite escura,
a blusinha sem mangas terminando no exato ponto onde começa seu short,
short xadrez,
branco com envergonhadas linhas verde claro,
em seus ouvidos,
sempre, tal como nos meus,
os fones tocando música em volumes estridentes.

Todos os dias nos cruzamos,
todos os dias nos vemos,
alguns dias surge um leve sorriso
por já nos conhecermos,
mas ainda sermos estranhos um ao outro,
um leve sentimento que criamos,
sem nos darmos conta, nem admitirmos,
somos conhecidos,
estranhos conhecidos.


Um Grande Abraço
Diogo S.Campos