domingo, 10 de julho de 2011

Sequência às Velhas Histórias

Depois de três horas de espera finalmente o homem certo saía do edifício. A preocupação em reconhecê-lo havia crescido, fazia oito anos desde a última vez que o vira. No decorrer deste tempo deixara de ser um simples universitário, até mesmo abandonara a carreira de repórter. Quase doutorado, já dava aulas na mesma faculdade que o formara, mas não perdera a prática nas investigações.

Seguiu o homem mantendo uma distância de cinco metros durante duas quadras e meia. Seu perseguido usava um paletó surrado, o que mostrava que crescera nos negócios, mas nunca aprendera a manter a classe perante a clientela, por mais que o tipo de pessoas e mercadoria com que lidava não exigia uma aparência muito bem tratada. O homem carregava uma mochila cor-de-rosa, pelas próprias contas, a menina devia ter pouco mais de sete anos, e se tudo estivesse correndo como planejado, logo terminaria.

Enquanto observava cuidadosamente o homem no meio dos incontáveis pedestres da capital, acariciava o dedo anelar da mão esquerda. Usava uma aliança de ouro branco, era alérgico à prata. Arrumou os cabelos encaracolados que lhe caiam sobre os olhos e pôs as mãos nos bolsos. Viu o homem pegar uma chave do bolso do paletó e, apressado, ir até um Chevrolet Corsa Sedan branco. Mais de dez anos de uso devia ter aquele carro, talvez quinze, já não era mais fabricado. Como esperado, estacionara em uma transversal para desviar do congestionamento na avenida, apesar de não ter claro o mapa da capital na cabeça sabia que o comportamento de seu alvo continuaria o mesmo. Em parte pela relação que tiveram no passado, em parte pelas duas semanas em que o acompanhara.

O homem abriu a porta do sedan. O perseguidor apressou o passo, sabia que precisava ser rápido. A rua não ficaria deserta por muito tempo. O sol se pondo e as sombras dos edifícios formavam um corredor de trevas que o daria uma vantagem, um ambiente seguro, mas a janela era curta. Puxou a mão do bolso e se aproximou pelas costas do homem. Desde sua primeira aula de defesa pessoal na época da faculdade sabia que era desse momento que se tratava.

Puxou o revolver calibre 38 Rossi 4 polegadas do bolso do casaco preto e acertou uma coronhada na nuca do homem de terno surrado e quase careca. A pancada foi forte. As pernas do alvo amoleceram e ele derrubou a mochila dentro do carro ao mesmo tempo em que caia na calçada. Com esforço chegou à parede procurando por quem o batera e se alguém poderia ajudá-lo. Estava sozinho com seu agressor. Quase sozinho.

O perseguidor puxou o cão do revolver e apontou para o centro da testa do homem caído, ajoelhou-se lentamente enquanto o alvo começava a tremer e suar de olhos fechados. Encostou o revólver no centro da testa da vítima. O homem abriu os olhos e reconheceu seu agressor.

-Jake? – a voz quase não saiu, mas o sorriso de canto de boca no rosto do agressor confirmou sua identidade. Puxou o gatilho.

Clic.

O barulho foi seco. Não houve disparo. O corpo do homem enrijeceu por um instante encostado a parece e então amoleceu, como se as forças derretessem.

Baixando a arma ele olhou para o interior do veículo. Lá estava a menina que esperava encontrar. Loira e de pele clara como a mãe, mas completamente diferente dos pais, os olhos eram verdes claros e os cabelos cacheados, uma gargantilha de ouro no pescoço revelava-lhe o nome: Sarah.

-O que você quer? Já disse para ficar longe da minha filha Jake! – gritou em uma retomada de forças, o homem sentado na calçada.

O homem armado ergueu o revolver preto mais uma vez.

-Sua filha? – o sorriso não foi contido desta vez. – Tem certeza?

-O que vai fazer Jake? – perguntou o homem que nunca demonstrara medo diante de qualquer situação que enfrentara até o momento, mas algo lhe dizia, algo no fundo de sua mente lhe avisou durante oito anos. Havia alguma coisa errada, cometera um erro. No passado havia mexido com algo o qual não compreendia. Sentiu a arma encostar-se em sua testa novamente.

-Jake! O que vai fazer Jake? – perguntava desesperado ao mesmo tempo em que olhava para os lados em busca de uma ajuda que não existia.

-Pare de chamar assim, não sou mais o moleque que você ameaçou oito anos atrás. –O homem parou de se mover como se as palavras tivessem efeito sobre ele. A criança de olhos verdes assistia tudo sem emitir um único som. Os carros pararam, as buzinas e os escapamentos silenciaram. Por um instante o universo parou. E os olhos dele deixaram de ser verdes e adquiriram um tom castanho mel. –Meu nome, é Jacob. – puxou o gatilho.

O barulho foi estridente.


...continua

Um comentário:

  1. De volta aos velhos tempos então ?!!

    Seria essa uma visão do futuro visto por si mesmo, feito uma projeção pessoal de algo que só você vê.. hum confuso
    Ótimo
    Bjos

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