sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

Histórias de Jake - Balança

Fingir já não adiantava mais.

Sentaram para conversar, para tomar uma decisão. Uma decisão que afetaria a vida de ambos de maneira que nunca sequer poderiam ter imaginado, jamais pensaram que correriam risco de vida ao decidir trilha o caminho que escolheram. Havia ali muito mais, neste momento atuavam forças que fugiam a compreensão de ambos.

-Por que aquela ligação ontem? Por que você está fazendo essa confusão toda? Você não quer mais é isso?

Ele não conseguia acreditar que ela estava perguntando isso, que era isso que ela havia entendido, droga, não era nada disso, como ela podia estar tão fechada nos próprios desejos e interesses, que não conseguia enxergar a verdade...

-Eu não estou feliz com esse relacionamento, tantas brigas sem serventia, sem sentido, esse nosso faz de conta, se escondendo dos outros! Eu não quero mais ter medo, eu não quero mais esconder, eu não sou uma pessoa para ter uma relação pela metade, eu não suporto a idéia de tê-la pela metade. Eu quero que seja de verdade!

Ela não respondeu. Não lhe encarava, não conseguia lhe olhar nos olhos, desde a vez que conversaram na madrugada dentro do carro, ela não o olhava nos olhos.

-Mas... Eu sei que você é confusa, que você não consegue tomar a decisão entre ele ou eu, por isso aconteceu tudo isso nos últimos trinta dias então... eu não vou te cobrar uma resposta, não vou apressar isso, vou lhe dar o seu tempo, por você, pelo o que eu sinto por você... eu vou me sujeitar a essa relação pela metade.

Ela o olhou, os olhos pesados, a incerteza... então as palavras saíram espremidas,da mesma forma que ele ouvira da boca daquela outra pessoa anos atrás, os dentes se ergueram a e voz saiu, proferindo silaba a silaba exatamente igual ao que a loira de olhos mesclados lhe dissera na última vez que se viram.

-Faz o que for melhor para você.

Ele tremeu. Não soube o que responder. Sabia o que queria, mas também sabia que aquilo que desejava não era o melhor para si próprio.

Levantou e a beijou.




-RESPIRA!!! RESPIRA!!!

-Vamos! Olhe para cima, olhe para cima e se acalme!

-Vamos Garota! Respire! Mortícia, pegue um copo com água.

A garota de pele clara e cabelos negros saiu para buscar o que ele lhe pedira.

-Olhe para mim garota, olhe para mim e se acalme, você só está engasgada, agora respire e tente tossir.

A amiga o olhou com força, como se fosse difícil fazer o que ele pedia, e com certeza era, a surpresa ao ouvir o que ele dissera a ver engolir mais comida do que sua garganta permitia passagem. Ela levantou e saiu aos tropeços, entrando no banheiro feminino e encontrando com a garota de cabelos negros.Voltaram alguns minutos depois, ambas com o mesmo tom de pele, mas só uma delas tinha aquele branco ao natural.

-Ela te ligou ontem, e você foi ao encontro dela? Foi isso mesmo que eu ouvi?

Ele abriu um leve sorriso, realmente achando graça.

-Se consegue formular uma frase dessas significa que já está bem. Que bom.

Ambas o olharam como que se estivesse lhe dando uma ordem para que continuasse a falar.

-Antes de prosseguir tenho de avisar. Contei isso hoje pela manhã para a minha amiga. Aquela loira sorridente, você nunca a conheceram pessoalmente, mas já falei dela para vocês. E o que ela me disse quando eu terminei foi “Eu não acredito que você fez isso, depois de tudo! Olhe... eu te larguei de mão, eu não tenho mais fé em você, daqui para frente você está sozinho.”

As amigas se olharam, algo naquele breve instante deve ter acontecido, alguma mensagem entre seus olhos foi escrita no ar, mas ele não leu.

-Ela me abandonou no momento em que acredito que mais precisaria de vocês, então... bem, não vou cobrar de vocês, mas vamos ver quais serão suas reações. Deixe-me começar.


-Não vamos ter essa conversa por telefone. Você que por um fim nisso, para o bem ou para o mal você disse? Então faça isso me encarando. Nós não começamos essa história pelo telefone, e não vamos terminá-la assim.

-É que... pessoalmente... eu não sei se consigo.

-Bem minha amiga, se você acha que não consegue então não teremos essa conversa nunca. A escolha é sua.

Ela ficou em silêncio por um breve momento.

-Está bem...

-Me encontre em frente a casa Dela. Estou indo.

click

“A casa Dela” era a casa da Loira de peito estufado, ele escolheu lá como cenário para sua última conversa com ela. Na maior parte das razões por que era o único lugar próximo que conhecia naquela região, a garota poderia deixar a filha aos cuidados da avó e ir encontrá-lo caminhando, mas também escolheu este lugar porque conseguia achar um tanto quanto engraçado, ele estava indo conversar sobre a traição Dela, fazia-o se sentir melhor ela pensar que foi traída com a loira, mesmo que isso não fosse verdade, servia para deixá-la menos a vontade enquanto estivesse ali. Ele era um animal ferido. Mas um animal ferido com garras.

-Não tinha outro lugar para escolher? –ela disse antes mesmo de bater a porta do carro para entrar. Não viu o sorriso dele, ninguém teria visto, foi interno, foi mental, uma satisfação que apenas ele podia sentir naquele momento.

Ela sentou no banco do passageiro mas não olhou para ele. Olhava para fora, através do vidro, e esta seria sua posição a maior parte da noite.

-Você me chamou aqui para conversar, então... vamos, fale.

Ela não respondeu, nem sequer se moveu, estava ali, olhando para o nada.

-Bem... talvez eu possa lhe dar uma pequena ajudinha.

Ela pareceu se mover, como se fosse uma

reação?

mas não disse nada.

-Eu ouvi até agora a versão do Galego, da Loira sorridente, ouvi a versão daquele visitante ao qual eu mandei enfiá-la lá onde o sol não brilha, mas até agora eu não ouvi a SUA versão de o que aconteceu naquela noite. Então... eu quero deixar você falar, eu quero que você me conte a verdade sobre o aconteceu do momento em que vocês foram embora até o momento em que entraram juntos pela porta da nossa loja.

Ela suspirou, não moveu o corpo, continuou sentada olhando pelo vidro e começou a falar. A mesma versão que seu cúmplice havia contado.

-Saímos dali e voltamos para a pizzaria porque ele notou que havia perdido o celular, não estava lá, fomos até o estacionamento ver se estava lá, também não. Conversamos um pouco até o caminho da minha casa. Ele me largou lá, era por volta da meia noite. Na manhã seguinte nos encontramos na esquina, antes de chegarmos à loja e entramos juntos.

A história lhe embrulhou o estomago. Lembrou de todo o nojo que sentira naquele dia, a repulsa por estar apaixonado por uma mulher que é capaz disso, de fazer, e de ocultar a verdade, de mentir. O sorriso no rosto dos dois e a hipocrisia de ambos ao lhe dirigirem a palavra, de sorrirem para ele... teve vontade de vomitar.

Sabia que ela estava mentindo.

Não pensava que ela estava mentindo.

SABIA.

-Foi apenas isso? –ele perguntou- é isso que você tem para me dizer?

-Foi o que aconteceu! O que você pensa de mim? Qual a sua opinião?!

-Minha opinião sobre você já está formada, nada que você faça ou diga irá mudá-la.

Ela estremeceu. Seus olhos estalaram por um instante então ela avançou novamente.

-O que você quer saber!?!?! Me pergunte então!

Ela devia ter pensado que ele recuaria, que o tom de voz dela se sobre colocaria ao dele. Errou, ele retrucou. Segurou o rosto dela entre as mãos, forçando-a a olhá-lo nos olhos e perguntou:

-TRANSOU COM ELE?!?

Ela não recuou, firmou as palavras com o peito, sugou o ar pelos dentes, e respondeu, mas sua resposta não foi em gritos, as palavras saíram prensadas, como se caminhassem em um sentido mas fossem empurradas para outro.

-Eu não transei com ele. Não transei. Juro pela vida da minha filha que não transei com ele.

Ele recuou, não queria ouvir aquilo, não sabia que ela podia levar uma mentira tão longe, não queria acreditar que ela tinha feito aquilo. Por um momento perdeu o rumo de suas ações, ações que planejara a tanto tempo, respirou e pensou por alguns segundos, então retomou.

-Essas são suas últimas palavras? Foi isso que aconteceu?

-Foi isso que aconteceu eu já disse! –ele pode ver, ou achou que pode, ela meneou um pouco o rosto e o reflexo da sua surgiu no que pareciam ser...

lágrimas?

Ele suspirou, tomou coragem e descarregou a verdade, sua última cartada que esperava não ter que usar.

-Você ficou sem amigos em nossa loja, ficou sem ter com quem conversar porque todos parecem ter escolhido me apoiar do que apoiar você, então a única pessoa para a qual você podia contar algo era a novata. Ela é jovem e fácil de se manipular, fui até ela, e ela acabou me contando a verdade, contando aquilo que você tanto quer esconder de mim.

Ela virou o rosto, assustada, e o encarou.

-Ela me contou que vocês dois não foram atrás de celular nenhum, que vocês foram a um Motel, e você chegou as seis horas da manhã em casa. E a razão pela qual você chegaram juntos na loja era que ele havia lhe esperado trocar de roupa quando a levou, claro que você não teve tempo de tirar a maquiagem.

Ela olhava, perplexa, provavelmente não estava surpresa por ter sido entregue, mas estava frustrada por ter cometido um erro tão bobo... tripudiar, contar vantagem e confiar em alguém que mal conhecia, aquela garota de quinze anos.

-Então... agora me diga... é mentira o que ela me contou? Porque diante de você me jurar pela vida de sua filha... eu realmente não sei mais no que acreditar.

Ela baixou o rosto e falou em voz baixa...

-Não, não é mentira, foi isso que eu contei para ela.

.....

...........

..

Ele pôs seu coração em uma balança, uma balança de dois pratos. De uma lado as partes vermelhas, seu amor por ela, de outro as partes negras, aquilo que dele ela havia destruído.

As vermelhas são mais pesadas, então mesmo quando menor em número conseguem manter a harmonia na balança. Seu coração já havia sido muito ferido por ela, mas não tanto quanto ainda seria.

Dessa vez ao pesá-lo a decisão foi fácil, foi simples ver qual lado era o mais forte.

.........

....

...........

O silêncio os consumiu, parados, sem reação por vários instantes, foi ele que tomou a iniciativa.

-Uma amiga minha, pele clara, cabelos negros, você não a conhece. Ela me disse certa vez... “Homens não perdoam.” Bem... eu estou aqui,

Ela ergue os olhos para ele, as face molhadas pelas lágrimas.

-Estou aqui para provar que isso não é verdade.

Ela continuou olhando... perplexa.

-Eu quero que dê certo, e vou fazer o que for preciso para isso, eu não vou desistir de você tão facilmente.

Ela olhava como se não acreditasse no que ouvia.

-Agora... acho melhor você ir, nós vamos ficar bem, conversamos mais outra hora.

Ele se inclinou para abrir a porta dela, esticou o braço esquerdo para a maçaneta...

Ela veio em sua direção,

Ele havia pensado em fazer isso,

Iria beijá-la,

Um breve beijo, na face.

Ela veio,

e ele mirou a face,

ela mirou sua boca.

Beijaram-se.

A mão dele abandonou a maçaneta, a mente abandonou os pensamentos, o coração abanou a dor, ali nada mais importava, tudo o que importava era isto, era esta sensação, este momento, quando se beijavam e estavam juntos, o mundo lá fora deixava de existir.


Pior do que antes,

Desta vez não apenas o silêncio, mas o queixo de ambas estava separado do resto do rosto. A amiga de cabelo mais claro se recompôs, levantou dando a volta na mesa e o abraçou, o abraçou forte, sem responder, sem questionar, apenas abraçando.

Fez ele se sentir bem, conseguiu até mesmo fechar os olhos e desfrutar daquele corpo quente.

Mas sabia qual era a sentença que queria ouvir. As palavras de Morticia,

Foram muito mais amenas do que ele podia imaginar.

-E agora? O que acontece? O que você vai fazer?

Ele deu de ombros, suspirou, se desvencilhou do abraço da amiga.

-Existe uma frase em francês,

Laissez Faire, Laissez Passer

-Significa mais ou menos:

Completaram juntos, ele e a garota de cabelos negros.

Deixa Fazer, Deixa Acontecer.

...continua.


Um Grande Abraço
Diogo S.Campos

Um comentário:

  1. O pior é que quando acontece... não é como se espera bjos no core amigo-lhe :D

    Keli

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