quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

Peso da Alma II - Veretido

- Ele não vai deixar você por um motivo óbvio – respondeu Denis, fitando-a por acima das lentes enquanto desenhava um tabuleiro imaginário sob a mesa com o dedo anular.

- Como assim não vai me deixar? Você entendeu o que eu acabei de te contar? Ele tem outra Denis, ou seja, não existe espaço para duas em um coração é lei da física lembra ?! “Dois corpos não podem ocupar, ao mesmo tempo, um mesmo lugar no espaço” bradou Natasha fazendo um gesto desdenhoso com as mãos.

- Para isso minha cara existe a ‘superfluidez ‘em que dois corpos sólidos, porém resfriados passam um através do outro como fossem feixes de luz que se cruzam, Denis gesticulava com as mãos fazendo alusão a um objeto refletido sob outro.

- O que eu quero dizer é ele te ama, ou melhor, você quer ouvir isso.

Natasha e Denis tinham uma maneira peculiar de conversarem, ambos usam analogias, citações e até mesmo frases célebres para definir as situações que viviam, qualquer outra pessoa jamais conseguiria entender uma palavra da conversa deles sem saber qual era realmente o assunto que falavam.

Ela franziu o cenho, mordeu o canto dos lábios enquanto escutava as palavras de seu amigo.

- Ele não deixou você isso é fato, e você já sabe dessa “superfluidez” (Denis movimentava os dedos no ar como aspas ao pronunciar a palavra) há umas duas semanas não foi à toa que o questionou não é mesmo? O amigo lhe dirigiu a pergunta num tom irônico quase ácido percebeu o olhar dela se encher de fúria ao admitir que ele tinha razão.

- Ok! Mestres dos Magos eu já sabia, ele ficou diferente da noite para o dia se afastou e “eu a vi” perguntei a ele quem era e o que representava para ele, apenas recebi como resposta não sei estou confuso.

Denis soltou uma gargalhada lacônica, sabia que fato mais irritante para Natasha era ele também “saber de tudo” antes de ela literalmente contar, assim como ela também via e o pior quando ele estava certo.

- Garota pelo simples motivo do Renan ter falado para você que ele está confuso demonstra que o sentimento em relação a você é mais forte na balança, o relacionamento de vocês pesou mais que essa garota. Não estou dizendo que é correto o que ele fez eu o repudio por isto, mas já estive na situação inversa lembra? Denis arqueou a sobrancelha lançando o olhar questionador para Natasha.

- Aham ... murmurou em resposta

- Eu já fui o outro e se te conforta não é uma situação lá das melhores e assim como ela eu também perdi.

- Mas você não entende....

- Shii! Denis fez um sinal de silêncio para ela com o dedo anular na boca e segurando-a pelo ombro com a outra mão.

- Me escute pode parecer canalhice da minha parte afinal sou um representante do sexo masculino e odeio admitir isso, mas somos sórdidos é tão mais simples para vocês é só falar sim, ou não enquanto nós temos que desenvolver um discurso e proferi-lo para cem mulheres distintas para que apenas uma diga sim.

Natasha o fulminou com os olhos.

- Pode parecer machista, mas não é ele agiu por instinto puro e único. Instinto animal, irracional o Renan não ama essa garota nem ao menos é apaixonado por ela ele se envolveu apenas para saciar o que há de mais primitivo em nós o impulso de predador o fascínio de exercer o poder sob algo vulnerável e sentir-se vencedor.

- Que horrível Denis estamos falando de traição, de quebra de confiança, de dormir e acordar todos os dias ao lado de alguém e perceber que não conhece o próprio inimigo. Na verdade estou com medo.

Denis contorceu os músculos faciais em uma expressão de espanto Natasha em momento algum demonstraria medo seja qual fosse a situação. Ele sempre soube que ela criava muros intransponíveis, para sua auto proteção que mesmo com todo o amor que sentia em relação a Renan o amor próprio sempre falava mais alto.

- Como assim medo? Questionou

- Primeiro já teve a sensação que não irá acordar pela manhã? Que o amanhã pode não existir? E segundo o problema não é ele, a traição é uma dor dilacerante como navalha cortando a carne, as feridas irão se curar e deixar cicatrizes o tempo se encarregará de sanar as derrotas temporárias o que está em questão é ela.

A face de Denis empalideceu, com uma das mãos cobrindo a boca segurando o queixo fez sinal com a outra para que ela perseguisse o desenrolar dos fatos.

- Ela precisa de mim, eu a ouço pedir ajuda. Tenho a sensação que ela está presa em um poço submersa pela água sufocando-a, ela bate freneticamente os pés em busca de alcançar a superfície. É estranho geralmente consigo “ver” as pessoas sentir, você sabe, mas ela é como se eu me deparasse com uma parede negra.

- Você está querendo me dizer que não sente raiva dessa garota e sim um sentimento de comoção, ou melhor, você sente pena é isso? Perguntou Denis.

Natasha pigarreou, esfregou a palma das mãos enquanto procurava encontrar as palavras para descrever a situação.

- Você é o único que será capaz de me compreender sem me julgar. Pode parecer loucura, mas ela precisa de mim eu sei e minha vida está nas mãos dela. Lembra de quando a... (ponderou iria pronunciar o nome da ex namorada de Denis) sua falecida por um triz quase causou a sua morte e você me disse que precisaria passar por tudo isso em busca do que você considerava felicidade.

- Sim e... respondeu ele.

- Eu te disse que meu ombro estaria ali para você chorar, poderia contar comigo e eu não te abandonaria?

- Continuo sem entender... espera você não tá querendo me dizer .... indagou Denis.

- Eu estarei na porta da casa dela hoje e você virá comigo eu preciso de você, quando chegarmos lá irá entender minha vida depende disso.

Denis retirou os óculos pôs sob a mesa, pressionou as mãos ao lado das têmporas e soltou um suspiro de incredulidade por entre os dentes.


To be continued


Keli Wolinger



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